12/02/2012

DEVANEIOS SOBRE A SOCIEDADE DESCARTÁVEL


Se esta história é real ou não ... deixo a critério de quem ler.

"Certa vez, uma senhora veio nos procurar para comprar um Kuromatsu para decorar seu estabelecimento comercial. Olha aqui, olha lá, e acaba por escolher um exemplar com cerca de 40 anos,e um trabalho de poda e modelagem que consumiu pelo menos 1000 horas, se tivesse sido feito de forma ininterrupta. Como sempre, orientamos essa pessoa a cerca dos cuidados que devem ser tomados ao transplantar uma planta. ´Olha, minha senhora... você precisa fazer assim, não esqueça disso e daquilo também. Conversa vai, conversa vem...  e: Opa! Peraí... Ambiente fechado não pode! De jeito nenhum! Ar-condicionado também não pode! Isso também não... (...) .Olha, nessas condições  não temos como garantir que ele sobreviva!´
Para nossa surpresa, a resposta dela foi: Não tem problema! O importante é que ela fique viva durante  1 mês, que é o tempo que dura o evento."

É a era do descartável. Em todos os aspectos, a velocidade é o que conta: meu Dell que só tem 1 ano já está ficando ultrapassado. Perder tempo lavando louça? Pra que? É só derrubar outra árvore, pegar a celulose e fazer mais copos descartáveis, e uns lenços de limpeza também, pq hoje em dia, pano de chão também tem que ser descartável.

Pratos, talheres, roupas, música, pessoas, relacionamentos e  plantas. Tudo é descartável.
Conheço um grande número de pessoas que não tem paciência para ouvir Chico Buarque ou Lenine. É bem mais fácil e economiza neurônio ouvir "Nossa, nossa... assim vc me mata...".  


Não sou contra o descartável. Eu também uso vários itens  (e acho lenço de papel a invenção mais higiênica do mundo!) E nem me considero uma pessoa sensível assim. Não faço parte do movimento Greenpeace, sem querer ajudo a poluir o mundo com monóxido de carbono e não consigo deixar de comer carne embora eu ache que os vegetarianos tenham razão. Nunca deixei de chupar laranja  por que ela não é orgânica, nunca participei de mutirão de arvorismo, tampouco sinto pena de plantas de corte, como rosas. Infelizmente elas nasceram pra enfeitar, tem o ciclo de vida curto e tchau. O importante é que a planta continua lá... firme e forte continuando a produzir mais e mais rosas.

Mas às vezes eu sinto dó de algumas plantas. Acho que dó nem seja a palavra certa,  talvez desperdício seja mais adequado. Por exemplo: a grama e algumas outras plantinhas usadas em cenários de eventos e comerciais, muitas vezes saem do set  diretamente para o lixo, se não houver uma boa alma que resolva levá-las para casa.
Vários produtores de plantas muito requisitadas no paisagismo como o buxinho, nem sangram esses arbustos, porque essa prática é  dispendiosa, e encarece  demais pra quem produz de modo industrial. Se a planta vai sobreviver? Quem se importa? É muito mais fácil e lucrativo produzir plantas descartáveis.

E aí voltando a historinha da senhora e o Kuromatsu, eu fico pensando... como assim, não tem problema se ele morrer? E os 40 anos de trabalho despendidos? Será que tudo pode ser resumido a:  " Dane-se... É só uma planta mesmo.  Quem mandou ser tão lerda pra crescer?" 
Esse é o tipo de atitude que  me sensibiliza. Talvez eu esteja levando em conta o apego emocional pelo fato dos Kuromatsus estarem presentes na minha família desde que eu me conheça por gente. Talvez a errada seja eu, que às vezes não me adequo ao pensamento da sociedade moderna. Ou talvez, não.

Quem sabe, os bonsaístas  entendam esse meu sentimento? Enquanto o mundo atual nos cobra pressa, rapidez, produtividade... o bonsai exige calma, espera, perseverança. Não adianta pagar, gritar, xingar e exigir que  fique pronto logo, pois ele tem seu próprio tempo.

Uma das melhores lembranças da minha vida, era de quando eu era criança e meu avô me levava para a roça. Eu sempre pegava a tesoura e ele deixava podar alguns dos seus valiosos pinheirinhos. É lógico que eu devia picotar tudo e  fazer o maior estrago, mas ele sempre dizia: Nossa! Como vc é talentosa! Ficou muito lindo!
Hoje eu entendo que o velho Nagao tinha a sabedoria para entender que  poderia até demorar, mas  o TEMPO o ajudaria  a consertar a minha "arte".

o "coisa fofa" passeando na plantação de Kuromatsu lá no sítio

4 comentários:

  1. Achei interessante a sua história... não sei se é ficção, mas me parece bem real. Sou suspeito pra falar, pois assim como você gosto muito das plantas. É algo que parece surreal... é um momento de epifania, algo que consegue transcender o meu eu. Conviver com os vegetais, observar as plantas e perceber as mais variadas diversidades de cores, texturas e formatos... isso tudo me deixa extasiado de deleite e em paz com o universo, é a plenitude de todos os meus sentidos.

    Acredito que essa sociedade descartável se configura no próprio devaneio. Será que vale a pena mesmo viver esse mundinho de faz de conta? Onde as pessoas melhoram o tempo mas, são incapazes de melhorar as atitudes? A tecnologia evolui mas, as pessoas não? O egoísmo já vem enraizado nas pessoas, assim dizia Schopehauer, com muita expertise em comportamento humano. A sociedade humana deveria ser a mais evoluída, mas não é, não é mesmo! Que a sabedoria e os bons valores sejam mais importantes que a boa aparência e o culto ao capital.

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    1. Pois é, Roberto! Outro dia, eu li em algum post que alguém enviou no Facebook que as pessoas se preocupam muito em querer deixar um mundo melhor para seus filhos, sendo que seria bem melhor se deixassemos filhos melhores para o mundo! E isso faz todo o sentido. Não adianta o mundo ser uma maravilha, se as pessoas não sabem valorizar o que tem. um abraço e volte sempre para visitar o blog!

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  2. Não duvido nem um pouco da veracidade da história! Infelizmente temos que lidar com esses absurdos no nosso dia a dia! Ah, também como carne, e flor de corte estão ali para embelezar! Adorei o blog!

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